Quem saberia dizer?

Hoje acordei com uma estranha sensação de mudar o mundo.

Como de costume dormi horas poucas.

A noite pra mim sempre foi um desperdício de tempo. Principalmente na minha idade. Lambendo os setenta. Quantos anos mais me restam? Tomara, com saúde, tantos quantos meu desejo se manifeste.

Se for seguir os passos do meu avô, por parte de mãe, talvez beire os noventa. Mas, caso for pelo mesmo caminho do meu saudoso pai, menos de oito anos me restam.

Se for me basear nas estatísticas dos tempos modernos, as quais afirmam que o brasileiro vive mais, tomara seja um exemplo do que elas ensejam, quem sabe chegarei aos mais de noventa? Tenho tudo para ir até lá. Oxalá com saúde, capacidade de discernimento, desejo genuíno de aprender sempre mais, dotado da inspiração que me cavouca todas as manhãs, e sobretudo o desejo de acompanhar meus netos em suas trajetórias por este mundo tão lindo, pena que os seres humanos persistam em sua voracidade predatória, destruindo tudo ao derredor, desconstruindo tudo que foi feito pela vontade de um ser superior, que não se deixa var, mas existe, em sua bondade infinita.

Hoje não assisti à televisão como de costume faço. Ao acordar, bem cedo.

Talvez, agindo desta maneira, passe o dia sem ver, desiludido, a tantas notícias ruins que são veiculadas  pela mídia sedenta de fatos tristes, onde pessoas perdem a vida antes de conhecer a beleza que nos espreita, a cada curva do caminho.

Quem sabe, tapando os olhos frente aos fatos acontecidos neste país tão lindo, pena que aos olhos do mundo aqui só acontecem bandalheiras, a corrupção mostra sua cara nojenta, as tragédias provocadas pelo homem ocorrem ceifando vidas, pondo em risco a felicidade de nossos iguais.

Quem sabe, fechando os olhos incrédulos ao que acontece na televisão, não tenha de constatar o quanto somos lesados por pessoas que são eleitas justamente para nos representar. E, ao revés do que acontece, estas mesmas pessoas nos ludibriam, recebem propinas, e enriquecem à custa do trabalho digno de outros,  trabalhadores de nosso país continental, tão lindo, e ao mesmo tempo tão desigual.

Quem sabe, desligando-me dos fatos do dia após dia, não sofra tanto, não me incomode com as coisas que acontecem por aqui, e sonhe com um país melhor, mais igual, onde os impostos pagos sejam em verdade endereçados ao seu correto destino.

Quem sabe, apartando-me das notícias ruins, infelizmente elas são maioria, tenha tempo e alegria de ver, a cada dia, as crianças sendo educadas em boas escolas, tendo, ricos e pobres, a mesma oportunidade de se darem bem na vida.

Quem sabe, algum dia, sem me desligar do noticiário repleto de noticias ruins, possa assistir, seja em que veículo de comunicação for,  a pessoas tendo as mesmas oportunidades de trabalho, sem que o desemprego nos avilte tanto, sem que a miséria nos incomode, sem que a maldade nos devore.

Quem sabe, algum dia, possa passar pelas ruas, sempre caminhando, como sempre faço, e veja o que meus olhos desejam. E não sem tetos fumando crack, pedintes de mãos estendidas, mães com filhos nos braços tentando vender paninhos de prato para dar sustento à família.

Quem sabe, num futuro não tão distante, possa comprovar que a violência foi contida. E não são cometidos tantos feminicídios como hoje acontecem.

Oxalá, possa assistir, durante a vida que me resta, neste nosso país, tão díspare, menos desigualdades, menos falsidade, mais correção no trato com pessoas, menos gente empobrecendo, apesar do esforço dos pais.

Quem sabe, mesmo não me desligando da mídia, possa constatar, pois não desejo continuar alheio aos fatos, seja que veículo for, a paz voltando a reinar, seja nos morros beira mar, qual seja na orla endinheirada.

Quem saberia dizer, um dia, perto ou longe, que não seja tão distante que eu não possa ver, crianças sendo violadas em sua inocência, sendo maltratadas por quem deveria delas cuidar.

Quem sabe, nem eu sei, quando este país vai mudar.

Hoje cedo não liguei a televisão. A noite espero, nela assistir, apenas notícias alvissareiras.

Bem sei que tudo isso é fruto de mais um devaneio meu. Mas, por que não sonhar? Quem sabe, algum dia, tudo isso em verdade vai acontecer. Que não seja tão longe que não possa ver. Tomara não me impeçam de sonhar.

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