“Mãezinha: pra onde as pessoas vão quando morrem”?

Naquela tarde de inverno, em seu começo, morreu a avó de Mariazinha.

Ela morreu de velha. Contava com quase cem anos. Com mais dois chegaria aos cem.

A menina, espicula desde as primeiras letras, sempre perguntava a professora coisas de criança.

“Como nascem as estrelas? Se a gente tocar no sol vamos derreter? E meu irmãozinho mais novo? Como ele veio ao mundo? E meu cãozinho querido? Existe um céu exclusivo dos cães? Ou vamos nos misturar, quando nos despedirmos do mundo, a outros bichos ferozes? Não há perigo de eles comerem a nossa alma? E, uma última pergunta professora: quando eu me casar, e tiver filhos, eles serão como eu, perguntona, inquisidora, falante pelos cotovelos”?

Na maioria das vezes a pobre mestra não tinha resposta a tantas perguntas. Mas prometia, na próxima aula, na semana que vem, talvez, procurar no Google o porquê dos porqueres, e se os encontrasse por certo iria dirimir as dúvidas que assaltavam Mariazinha, a menina perguntona, sempre a procura da reposta dos porqueres.

Naquela tarde noite quando a vó de Mariazinha se despediu a meninazinha esperta ficou a um canto do velório. Olhando de um lado a outro. Vendo as pessoas se aproximarem da mãe, abraçarem-na, falar alguma coisa aos seus ouvidos, e depois se afastarem pé ante pé.

Ela não compareceu ao sepultamento. Ficou no seu quartinho escuro, olhando as estrelas, pensativa e inquiridora.

Naquela noite ela não dormiu nem um segundo. Sonhou com os anjos, com suas asas brancas, com as estrelas faiscantes.

Na manhã seguinte ao enterro de novo Mariazinha voltou a perguntar a mãe, respeitosamente, para onde iriam as pessoas quando morrem.

A mãe não lhe deu atenção. A perda da sua mãe foi sentida por dias e dias longos.

Mariazinha, boa menina, respeitou a mudez de sua progenitora.

Um mês se passou. Mariazinha voltou à escola. Era período de férias de meio de ano.

Ainda impressionada com a morte das pessoas, o que se passava além da vida, a menina, inquieta e observadora, novamente viu uma rolinha morta caída ao chão.

Levou o pássaro de olhinhos fechados a casa dos pais. Numa caixinha enfeitada com uma fita amarela ali foi sepultado o pobre bichinho recém falecido. Por cima da covinha rasa uma cruz singela. Com a seguinte inscrição: “rolinha querida. Não se preocupe. Sua alminha boa não vai ficar por aqui. A ela foi reservado um espaço especial no céu dos passarinhos. Um dia nos encontraremos. Não fique triste”.

É chegada a noite. Mariazinha passou em claro naquela noite escura. As perguntas, as dúvidas ainda a assaltavam. E eram muitas.

À mesa do café da manhã, percebendo a mãe mais tranquila, Mariazinha voltou a baila com a mesma pergunta de sempre: “mãe, para onde as pessoas vão ao morrerem”?

Desta vez a pobre senhora não teve como fugir da resposta. Sua filha precisava ter sua dúvida resolvida.

Com todo carinho de mãe foi assim que ela respondeu a sua filha: “Mariazinha. As pessoas quando morrem, caso elas sejam boas, vão direto ao céu. No caso contrário um longo caminho as espera. Mas não se preocupe filha querida. Você, boa menina, quando vier a morrer, ainda vai tardar muito, um lugar especial a espera. Um verdadeiro paraíso. Cheio de riachos límpidos. Com muitos bichinhos a esperá-la. Pássaros canoros trinarão. Velhinhos de olhos ternos, entre os quais sua avozinha, e eu junto ao seu pai, vamos abraçá-la de novo”.

A menina agradeceu a mãe a resposta. Mas não emitiu nenhuma opinião própria. Ficou calada, observadora, e logo passou ao seu quartinho.

Naquela noite estrelada Marinha passou de olhos abetos olhando as estrelas.

Uma estrelinha em especial chamou-lhe a atenção.

Por que não ela seria o paraíso do qual a mãe falou naquela manhã tão linda? Seria a estrelinha o céu pra onde a avozinha havia se mudado?

Sempre inquiridora, ávida por novos conhecimentos, no dia seguinte a noite quando viu a estrelinha piscar pra ela, Mariazinha voltou a perguntar a progenitora, pensando saber a resposta a questão que tanto a incomodava: “querida mãe. Agora já sei a resposta pra onde as pessoas vão quando morrem. Uma estrelinha miúda me respondeu. Eu sou o paraíso tão procurado. Basta para isso sonhar. Que todos os sonhos bons são convertidos em realidade. Para isso basta devanear. Um cadinho de poesia não faz mal”.

Mariazinha se tornou, mais tarde, anos mais, uma poetisa inspirada. Ela não morreu. Quando partiu deste mundo ficou encantada. E passou a morar naquela estrelinha que pisca mesmo a luz do dia. Hoje mesmo a vejo piscar.

 

Deixe uma resposta