Metade de mim

Hoje, meio de semana, dezembro quase no fim, ano da mesma maneira fechando os olhos sonolento, ao subir a rua da minha casa a portaria do condomínio onde moro vi uma linda arvorezinha florida pela metade.

Metade dela eram folhas verdes. De uma verdice intensa. A outra pouco a pouco se revestia de flores entre um roxo suave e um azul confortável.

Creio, embora não seja entendido de flores, pouco sei de árvores, em menos de dias a tal arvorezinha vai estar completamente vestida. Ela vai estar parecida a uma árvore de Natal. De um natal que foi coberto em pouco tempo por apenas saudades dos brinquedos que costumava receber debaixo daquela árvore, às vezes artificial, por vezes era um pinheirinho verdinho, noutras tantas era uma comprada simulando uma de verdade. Que era desmanchada logo depois da visita de Papai Noel.

Metade daquela árvore, creio que chamada de Dama da Noite, se não me engano, por favor, me corrijam, estava cheia de flores recém-abertas. A segunda ainda por se engalanar em flores mil cores.

Foi esta visão que me fez pensar em nós. Todos somos duas metades. Duas partes díspares. Ninguém nasce com duas metades completamente iguais. Simetria perfeita inexiste.

Do lado direito quase tudo é igual. Um braço de cada lado (a não ser nos desprovidos de um deles). Duas pernas que se equivalem. Da mesma forma esqueçam no caso da perda de uma das duas. Um só face. Um só nariz, com duas narinas. Uma testa ampla ou não. No meu caso a minha é enorme. Desprovida do topete que sempre amei. Duas sobrancelhas peludas. Refiro-me ao meu caso. Dois olhos inquiridores. Duas bochechas rosadas. Um só queixo. Um pescoço único. Um tórax forte ou não. Abdome é um só. A pelve idem é única. Por baixo dela o aparelho genital, minha especialidade médica, é composto de uma só bexiga, uma glândula sem serventia no velho, um pênis que tem função precípua de urinar quando de maior idade, dois testículos que perdem a utilidade quando as crias já nasceram, uma bolsa escrotal chamada de escroto, duas pernas que se equivalem. No meu caso como elas andam! E dois pés sofredores andarilhos que são.

Mas não é sobre a duplicidade dos lados direito e esquerdo que gostaria de escrever nesta crônica de hoje.

Temos não apenas dois lados semi-iguais, com duas personalidades. Que não somente se tangem. Como idem se apreciam bastante.

De manhã a gente acorda com nossa metade um tanto quanto aborrecida por acordar cedo. Na parte da tarde, quando faz sol, a outra metade nossa sorri de felicidade.

Somos alegres aos finais de semana. Véspera de feriados então, quanta alegria incontida. Nossa metade alegre predomina nestes dias. E quando chega a segunda, quanta preguiça mostra-nos que é começo de semana. E temos ainda seis dias para renegar as segundas.

Bendita nossa metade chamada sexta-feira. Hoje é quarta-feira, estou quase de férias, aí, neste final de ano a minha totalidade, não metade, só tem motivo para ficar alegre.

Em poucos dias estaremos no ano novo. Dois mil e dezessete nos acena por inteiro que o ano vai morrer. Se a metade do ano novo vai ser de fato um ano bom quem sou eu para antever?

Agora, quase sete e meia, um sete mais quase metade entre o sete e o oito, aqui estou, no consultório, a espera que apareçam pelo menos a metade dos pacientes que agendaram as consultas. A outra metade fica para depois das minhas merecidas férias. Volto depois do dia sete de janeiro. Não metade de mim. Eu inteiro.

Sou indivisível. Embora tenha duas metades. Como aquela linda arvorezinha que hoje se abriu em flores defronte a uma casa vizinha de onde moro.

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