Mesmo à sua ausência sinto-lhe a presença

Até parece que foi ontem que o tinha ao meu lado.

Ainda hoje me lembro.

O passado ressurge.

Naquela Boa Esperança onde nasci.

Fazem tantos anos. Precisamente setenta.

Naquela rua, de nome Coqueiral, número 155, vim conhecer o mundo. Depois de esperar menos de nove meses no aconchego da intimidade de minha querida mãe.

Sou de sete meses. Afoito desde quando nasci. Uma prematuridade que em absoluto não prejudicou meu desenvolvimento. Eu sou aquele menino lourinho que é visto naquela pracinha, cuidado pela minha querida tia Cida. Que ainda vive ao lado de seu filho. Aqui nesta cidade tão linda, que adotei como sendo minha.

Meu pai, Paulo José de Abreu, oriundo dos Abreus de Ribeirão Vermelho, nascido na comunidade das Três Barras, onde meu tio Zito tinha uma fazenda, onde passei minha infância perdida nos anos, trabalhava na agência do Banco do Brasil na terra imortalizada por Lamartine Babo, em sua Serra da boa esperança que encerra no coração do Brasil.

Depois foi transferido para esta cidade. Onde aprendi as primeiras letras. E por elas me apaixonei.

Ainda me lembro dele, vestido num terno cinza, elegantemente trajado, comigo nos ombros, ao lado de minha saudosa mãe.

Uma vez feito gerente daquela casa bancária desempenhou suas funções como galhardia. E ali fez carreira. Até a aposentadoria.

Mas, segundo ele mesmo dizia, com toda sabedoria: “o ócio é o começo do fim”, depois de aposentado, com justo mérito, outra atividade recomeçou com rara competência.

Ainda me lembro de suas petições escritas na velha máquina de escrever.

Exerceu a advocacia com lisura e competência. Quem com ele conviveu pode atestar minha confidência.

Mas pouco tempo durou sua outra lida. Aos pouco mais de setenta anos, passados sete, caiu enfermo.

E do leito nunca mais se levantou.

Mas quem disse que meu pai, ainda capaz de caminhar, ficaria em casa? Ele, teimoso que era, persistia em dirigir. E quantas vezes fui chamado a intervir, quando ele parava o carro em plena rua, atrapalhando o trânsito, pondo em risco a própria vida e a dos demais.

Foi duro confiscar-lhe a chave do veículo. Mas ele, casmurro, insistia em ser ele mesmo. Mesmo com a consciência num turbilhão de insanidade, na impropriedade da doença de Alzheimer, que acabou levando-o para longe de nós, sua família que o amava tanto.

Ontem foi o dia dos pais. Foi um dia de saudades. Muitos pais ausentes foram lembrados.

E eu ainda me lembro do meu. Com aquela generosidade que o fez respeitado por toda cidade. Pela sua lisura no trato com os clientes. Com sua enorme capacidade de trabalho.

Por tudo que ele representou e representa.

Ao meu saudoso pai. Mesmo ausente ele se mostra presente aonde quer que eu vá.

Ele nunca vai ser esquecido. Enquanto a minha vida durar.

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