Um povo com antolhos

Também poderia ser chamado de viseiras, tapa olhos, aquele artefato usado pelos animais que puxam carroça para evitar tropeços ou que se sintam atraídos por qualquer coisa lateral que os faça desistirem de ir adiante, e chegue ao finito morro com a carga pesada que a vida lhes chama à responsabilidade, já que é o único transporte que o homem do campo possui para levar o leite ao cimo do morro, já que o caminhão leiteiro não se atreve a descer ou subir a ladeira empinada, e, caso o produtor de leite, às turras com as contas, devedor de compromissos com o banco perdulário, não tem outra opção que não ganhar a vida dura assentado a um banquinho tosco, agarrado as tetas das vacas, e não tem outras tetas mais lucrativas, como certos políticos têm mamado em seus cargos eletivos, já que dizem, com alguma propriedade, que os brasileiros não sabem votar.

Povo desenvolvido é povo educado. Que faz da escola um caminho seguro. Tem pelas letras, pelas palavras, livros, uma paixão indelevelmente grudada ao seu caminho reto.

E, se se desvia deste caminho da cultura, logo logo, em seguida, persegue outro qualquer, chamado de educação, de ética e decoro, e não cai no logro de votar em quem alardeia isso, e foge ao compromisso sabidamente, espertamente, discursado em palanques sub-reptícios. Antes de pleitos cheios de defeitos. De falácias equivocadas. De promessas vãs. Esvaziadas assim que toma posse no cargo ao qual se propôs. E, uma vez deputado, senador ou  outro cargo imerecido, assim que ocupa aquele trono fictício, mera ilusão dos pobres que o elegeram, volta a cara deslavadamente aos seus votantes. E só pensa em lucrar, tirar o investido rapidamente. Tomando parte em coisas que só são descobertas anos depois. Que um juiz togado, homem preparado, sentencia-o a devolver aos cofres públicos toda a propina amealhada, todo o ganho indevido, e toda a maracutaia a descoberto vem a tona, esparramando merda mole para todo lado.

Estamos a par de passos de novas eleições. Outubro logo cai no calendário. O Brasil, conforme dito popular, só começa a nascer depois das festas de momo. Esperemos o carnaval passar para deixar nossas fantasias de lado. E vestir outras roupas mais em conformidade com a seriedade que deveria fazer parte de nosso cotidiano. E infelizmente não faz.

Hoje, último dia de janeiro, dia de céu escuro, desci a rua com o guarda-chuva aberto. E como é difícil andar sob chuva em nossos passeios despreparados ao asseio. Marquises existem. Ainda melhor. Pena que muitas delas, senão a maioria, furos brotam em suas lajes mal feitas. E a gente, caminhantes, saímos de casa enxutos. E chegamos ao trabalho empapados pelos pingos grossos que caem sobre nós desavisados.

Assim que cheguei a onde estou, em minha oficina de trabalho, ao abrir a internet para me inteirar das novidades, quase caí da cadeira de espaldar alto.

Num portal noticioso, o qual fez manchete, descobri o que já imaginava antes.

O ex-presidente, condenado a onze anos e um mês de cadeia, não sei quando isso vai acontecer, tomara em breve, mantem larga vantagem sobre os demais candidatos. Ele aparece com até 37% das intenções de voto. Sem ele o tal de Bolsonaro lidera. O ex, com nome de um parecido a peixe, mas se trata de um molusco, conserva, mesmo com a enxurrada de maracutaias que o condenaram a pena pesada, com a sentença decretada e ainda não cumprida, conserva a mesma força eleitoral. Seus crimes não mais ficam a encobertos. Apesar de seus advogados dizerem-no inocente. Corrupção ativa e lavagem de dinheiro é coisa grave. Gravíssima, no meu lúdico entendimento. Desconfio, com certa dose de confiança, que o candidato indicado por ele seria vencedor da contenda eleitoral. Uma herança maldita. Por sinal.

Um dia destes fui ter à roça. Foi quando vi um burro puxando carroça. Com um par de viseiras de cada lado dos seus olhos.

De novo na cidade, sob esta chuva que inda hoje se anuncia, ainda sob o assunto eleições, sobre o ex que ainda congrega uma legião enorme de simpatizantes, mercê de sua condenação conflitante a ética e o decoro, penso naquele burro com seus tapa-olhos. Ou viseiras, ou antolhos.

Nosso povo brasileiro, não seria como aquele asno ululante? Perdoem-me os que pensam diferente. Mas, como sofismar não deve ofender, fica aqui minha lucubração sem viseiras ou antolhos. Sabemos votar? Ou a resposta seria um retumbante não!!!

 

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