Honestidade, ética, decência, responsabilidade. Virtudes que deveriam ser seguidas a risca em nosso comportamento diuturno.
No entanto não se trata da maoria que as pratica. Poucos seres humanos nelas se inserem. E levam a sério essa conduta que deveria nortear nossa vida.
Vamos começar pela honestidade. Lisura retrata a mesma coisa. Ser correto nos atos. Levar vantagem em tudo seria certo? Pena que muitos se alimentam no mesmo prato. E passam pra trás aqueles incautos inocentes inúteis. Pessoas puras e crédulas que nem imaginam com quem negociam. E quando descobrem as falcatruas já é tarde demais. E o desonesto que as logrou já se locupletou com o roubo. Assim caminha a desumanidade. Uns mais safados. Outros deixando bons exemplos de idoneidade num rastro certeiro; correto que deveria ser prato cheio em nossa mesa de cada dia.
A seguir segue a ética. Também conhecida por decência. Apadrinhada pela responsabilidade. Coisas e loisas indicativas de bom comportamento. Todas elas pra mim são filhas ou netas daquela pessoa a qual conheço de velhos tempos. Como exemplo de retidão. Amor ao trabalho. Lisura e ética no trato com qualquer que seja. Seja vizinho de cerca ou desconhecido. Amigo ou aparentado. Família própria ou qualquer uma que lhe peça ajuda.
Ele coleciona calos nas mãos e amor no coração. De tez tostada pelo sol com os cabelos embranquecidos prematuramente. Voz pausada e atos comedidos. Esse meu amigo da roça pra ele não tem tempo ruim que logo vai melhorar.
Fui seu padrinho de casamento. Anos se foram e ainda desfrutamos da mesma amizade. Ele e eu temos passagens inesquecíveis em nosso convívio sempre amistoso e fraterno. Quando eu, teimava em tirar leite, pensando equivocadamente que todo médico podia ser fazendeiro. Mal sabendo a razão de o leite ser branco saindo das tetas de vacas pretas. Ou se vaca de três peitos dá a mesma quantia de leite da outra de quatro perfeitos. Levava manta nas catiras com vizinhos velhacos que me passavam pra trás. E era ele quem me ensinava o cadinho que aprendi nas lidas rurais.
Meu amigo me acudia quando uma vaca minha atolava até os chifres que não tinha. Já que essa infeliz vaquinha era mocha. Num brejinho rasinho onde se afogavam girinos que seriam futuros sapos. Ele sempre pronto me ajudava quando meu retireiro faltava. E com os dedos ordenhava minha vacada. Já que eu nada fazia a não ser agradecer sua gentileza. Nas tantas vezes que ele prontamente me acudiu.
Há tempos passei minhas vacas aos seus cuidados. Contando nos dedos já faz mais de dez anos. Cansado de tomar prejuízo tardiamente descobri que vaca não da leite de graça. Tem de tirar e custa caro para o lucro se mostrar.
Pensei em passar adiante meu sonho de ser fazendeiro. Era um retireiro a cada ano. Levava, na caçamba da minha caminhonetinha, sacos e sacos de ração e voltava com ela recheada de carrapatos, poeira e desilusão.
Sabiamente, recomendado por amigos e entendedores do oficio, passei adiante minha rocinha dantes prejuizenta. Enquanto eu tirava cinquenta litros de leite por semana. Isso quando o retireiro comparecia. Meu amigo, por mim apelidado de Senhor Honesto, com suas mãos caludas tira. Com ajuda de seu filhotão mais novinho. Cujo nome é Binho. Mais de quinhentos litros dia. Fora o lucro com as crias de suas ruminantes que comem e ruminam.
Meu amigo, arrendador de minhas terras férteis. Tem por dogma de conduta a honestidade. Não deixa passar um dia sequer sem me pagar o aluguel devido. Não atrasa e paga em dinheiro vivo mesmo se algum bezerrinho morre.
Foi no sábado último o acontecido.
Quando recebi o pago do aluguel nem dei de contar as notas recebidas nem se o valor estava correto.
Embolsei aquela dinheirama e meti no bolso. Ao chegar a minha casa beira lago dei pelo logro. Mais de quatrocentos reais eram passados.
Era ainda cedo. Na volta iria devolver a quantia ao seu dono. Assim o faria com certeza.
Já passava a hora do almoço quando recebi a visita inesperada do Senhor Honesto. Não era de seu costume. A honestidade dele brotava em cada palmo da minha rocinha. Tanto no capinzal seco quanto na roça de milho a ser plantada na época oportuna.
A primeira providência que tomei foi devolver a sobra do pagamento pelo aluguel. Eram quatro notas de cem reais. Novinhas como capim novo depois de uma chuvica mansa.
Percebi, nos olhinhos clarinhos do Senhor Honesto. Que já sabia de antemão do engano na contagem do dinheiro. Talvez não querendo me importunar. Uma coisinha chamada de gratidão. Foi ele quem me falou. Com os olhos rasos d’água: “que bom tratar com pessoas honestas como você.”
Retribuí a gentileza ao Senhor Honesto devolvendo a fala. Honesto é você meu amigo.