Nunca irei me esquecer da primeira

Dizem que a primeira vez a gente nunca esquece.

Mesmo que seja na pressa do afogadilho. Jovenzinhos ainda desestimulados pela presença dos pais da criança. Naquela sala de visitas sob olhares atentos dos dois. Ao tentar ir mais adiante. Naquela atitude antes dita pecaminosa e agora não mais. Relávamos a mão boba por debaixo da saia daquela namoradinha que hoje por certo é avozinha. E nada encontramos a não ser a falta de uma calcinha. Mas tivemos tempo de retroceder. Foi aquela a primeira vez que nos sentimos avexados em não ir mais adiante. Já que nas outras tentativas conseguimos afinal nosso intento. Que não era senão outro ir ao fundo do poço. Mas o que nos impediu não foi senão a intromissão do irmãozinho mais novo daquela meninazinha acostumada a se deixar bolinar. Que adentrou à sala e me pediu, como de outras vezes, que lhe pagasse a entrada da matinê. Para assistir aquele filme de sacanagem que vimos nós dois.

Aquela foi à primeira vez, mas não a derradeira.

Tempos se foram. Anos se sucederam.

Um dos meus amigos, mais chegados. Do qual tenho lembranças recheadas de saudades.

Cujo nome não me lembro bem. Como de sua pessoa austera e de boa índole.

Ele se casou ainda jovem. Aos menos de vinte, acredito.

Aquele consórcio ia bem nos primeiros anos. Depois naufragou como o inafundável Titanic por incompatibilidade de posições. Ela queria que ele ficasse por cima. Ele na posição diametralmente oposta.  Aquele casamento durou apenas cinco anos.

Meu amigo, durante aqueles primeiros anos, era um médico bem situado na profissão.

Poder-se-ia dizer que enricara. Amealhou uma fortuna de fazer corar tio Patinhas quando mergulhava na sua piscina de dinheiro vivo.

Quando se separou da primeira esposa, mão fechada que sempre foi, ele acabou levando a melhor nesse litígio não litigioso (se é que se pode escrever assim).

Mas, desacostumado a viver só acabou trocando gato por sapato. Numa mesa de bar. Depois de tomar todas e mais algumas outras. Encantou-se por uma mulher da mesa do lado. Era uma loura linda, mas não burra. Que com o passarinhar dos anos deixou-o na rua da amargura. Ela saiu da relação levando dele a casa e o colchão. Uma oportunista de plantão.

Meu amigo doutor, não satisfeito com a separação tentou outra vez.  Foi a terceira e não a derradeira desilusão. Sentindo-se o mais infeliz dos homens. Quando pensava que tudo estava irremediavelmente perdido. Mais uma vez bateu na mulher errada. Não bater no sentido lato da palavra. Ele nunca levantou um dedo na direção do nariz de quem quer que fosse. Ainda mais de uma dama. Se fosse de um rei de espada até que seria possível.

Mais uma relação aconteceu. A quarta parecia que se daria menos pior.

A mulher com a qual juntou os panos era mais falsa que botijão de gás vazio pensando estar cheio.  Mais uma vez enganou-se por não ver o peso. Ao final de alguns meses tudo que parecia doce azedou-se. A mulher o traia com o padeiro. Depois do almoço com o verdureiro. Isso sem deixar o leiteiro de fora, pois dizem, nas cercanias, que ele, além de usar aqueles comprimidinhos azuis. De propriedade do doutor. Ainda negava fogo. E um dia acabou incendiando a linda casa onde moravam.

Mais uma vez o bom doutor se ajuntou a outra mulher. Foi a quinta tentativa malograda. Ela deixou-o depois de levar todos os seus pertences. Já que ela dizia que não lhe pertencia. Era apenas mais uma em sua vida.

Desiludido com as relações mal sucedidas um dia encontrei meu colega na ponte da desilusão.

Ele, cabisbaixo, ensimesmado, ameaçava se atirar no leito seco do rio.  Tentei demovê-lo do seu intento. Chamei-o as falas em voz doce.

“Não se desespere colega. Não atente contra a própria vida. Olha pra cima e veja o céu. É pra lá que pretende ir? Sei das suas desilusões amorosas. Dos seus desencantos. Não perca a esperança. De outra vez por certo vai acertar na escolha.”

Ele me olhou de cima abaixo. Abraçou-me carinhosamente. Desatou a chorar copiosamente. E assim me respondeu: “olha meu amigo. Ainda me lembro da primeira esposa. Como a deixei escapar. Se pudesse reencontrá-la faria na maior felicidade. Ela ainda é o primeiro e o maior amor de minha vida”.

Soube depois de passados anos que eles se reencontraram, não aqui, e sim em outra vida.

 

 

 

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