Filhos são o jantar. Netos a sobremesa

Sempre que começo uma das refeições do dia logo me vem à cabeça o que saborear depois.

Sou apaixonado pela vida da mesma forma que o doce me atrai.

Que tal um queijo de minas enrolado a uma goiabada feita na roça? Ou aquele de figo em calda da mesma forma entremeado com queijo fatiado? Ou de laranja própria a fazer doce, bem feitinha, como minha avozinha fazia, e minha especialíssima esposa sabe fazer com exatidão. Não tenho tanto chamego pelo chocolate. Nem mesmo um brigadeiro me faz salivar.

Doce de leite, feito com leite gordo saído das tetas da vaca, bem acompanhado por outro subproduto das tais ruminantes, um queijo recém-desenformado, salgado a gosto, não me provoca desgosto jamais.

Já o olho de sogra, nada contra a mãe da minha Rosa, dona Edmeia, embora um pouco surda, é uma pessoa adorável, me faz deixar a ameixa apavorada com minha voracidade ao abocanhar um a um. Até a bandeja terminar.

Vamos deixar os doces de lado. Caso contrário irei engordar.

Já tive filhos. E não me arrependendo de tê-los tido. Foram dois os pimpolhos. Que hoje já são adultos. E ambos não deram tanto trabalho para vê-los assentados na vida. Creio ter dado mais aos meus pais.

Mas, a alegria ao ver meu primeiro neto nascer em nada se compara. Estive presente na sala de parto. Entre embevecido e embasbacado.  O rapazinho já tem seu nome assaz consagrado nas redes sociais. Um belo dia, como o de hoje, ao caminhar com ele pela praça principal da cidade, uma senhora bastante simpática, ao nos ver exclamou: “o senhor é avô do Theo?”

Confesso que na hora estaquei num sentimento entre incredulidade e novidade. Era eu o avô dele ou era ele o neto meu?

Como Theo me presenteia felicidade quando daqui saio e dou uma passadinha, depois das obrigações da manhã, e o vejo correr na pracinha próxima entre companherinhos da mesma idade. É como se eu mesmo voltasse no tempo. E desse uma voltinha na pracinha da velha Boa Esperança onde nasci. Já disseram, e creio piamente, sem nenhum sentimento grandiloquente, que Theo se parece a mim. Mas o fato notório é que eu em verdade era a cópia fiel do meu querido Theo aos dois aninhos completos dia vinte de julho perto.

Agora a idade acabou fazendo estragos na minha pessoa. Antes tinha cabelinhos louros e encaracolados. Agora eles foram abaixo, e não os encontro mais no travesseiro.

Imaginem quando o Gael nascer? Meu segundo neto deve vir ao mundo ao fim de agosto, entrando setembro. Vai ser como um sopro de primavera. Como as flores do ipê que agora começam a despetalar de novo.

Outros netos virão. Um irmãozinho do Theo, ou seria uma irmãzinha, nada contra os meninos, mas confesso que prefiro uma meninazinha, logo nos fará companhia.

Não sei se aqui estarei para ver a todos caminhando ao meu lado. De aqui a dez ou mais anos não sei se poderei abraçá-los. Caminhar com eles na pracinha do lado. Fazer as suas vontades. Mimá-los com o mesmo carinho que hoje dedico ao Theo.

Tomara a vida me permita sobrepor a felicidade que sinto agora aos anos que se seguirão. Oxalá a saúde não me abandone. Que ainda tenha força suficiente para carregá-los todos num carrinho de mão, e não os deixe irem na contramão da vida. Que eu tenha sanidade suficiente para norteá-los no melhor caminho, incumbência não apenas dos seus pais como penso ser a minha. Que eu possa ainda vê-los encaminhados vida afora. Que não joguem suas chances fora. Que sejam pessoas de bem. Como nosso país precisa como nunca precisou.

Foi muito bom esparramar filhos pelo mundo. Eles me deram netos. E ainda existe quem não deseja ter filhos. Quem não os têm nunca vai ter netinhos a pular em seu colo. Acarinhar-nos a barba nevada. Procurar presentes debaixo da árvore de Natal. Quando ela se fizer presente. Nem ao menos ficarmos boquiabertos ao vê-los dar os primeiros passos. Quando eles caírem seremos nós a levantá-los de novo. E quando nós mesmos nos debruçarmos ao chão, quem sabe nossos netos irão nos amparar, cuidar de nossa decrepitude, fazer um pouco do tudo que fizemos por eles?

Já disse que adoro doce. De leite então nem se fala. Na hora da janta antevejo uma bela fatia de goiabada cascão ao lado de um naco de queijo fresco das Minas Gerais.

Nada contra a comida que vem antes. Nada contra os filhos. Ao revés. São eles que nos dão netos de presente.

Mas como disse antes.

Filhos são como a comida que antecede a sobremesa. Netos são filhos açucarados. E como eu adoro doce.  Da mesma forma que amo e amarei sempre – netos que virão.

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