Até quando?

Onze do mês de um dezembro do ano da graça de dois mil e dezessete.

Há quatro dias atrás fiz mais um ano de vida. Já hoje quem aniversaria é minha amada Rosa. Pequena grande mulher como costumo dizer ao me referir a ela.

É ela quem me atura a não sei quantos anos passados. Suporta meus repentes de ira raivosa bem como de terno reconhecimento ao seu inquestionável mérito.

Ela se vira nos mil. Cozinha como poucos. Ama igual a uma Julieta ao amar seu Romeu. Corta tecidos como eu costumo deixar a mostra vísceras de seres humanos na minha especialidade de urologia. Quando me ajudando a administrar minhas curtas finanças: ela é a cuidadora do meu cartão de crédito, preenche os cheques com maestria, eu apenas assino, verifica com competência meu sempre falido saldo bancário, e, de quando em vez diz: “Paulo Rodarte. Cuidado com os gastos exagerados. Lembre-se que os bancos não perdoam dívidas. Saldos no vermelho indicam juros extorsivos”.

Mas eu, não muito ligado a dinheiro, adoro letras, aos números torço a orelha, mesmo assim não mudo. Burro velho não muda a marcha. Que o diga a Salomé, uma mula tinhosa que um dia me derriçou ao chão depois de um corcoveio certeiro.

Sou deveras grato a tudo que minha Rosa tem feito pela nossa família. São poucos os componentes, apenas meus dois filhos, seus partícipes consortes, e meu netinho que agora deve estar dormindo um sonho dos anjinhos puros. Além de um irmão e uma irmã. E sobrinhos poucos.

Neste exato momento lanço aqui, nesta crônica de hoje cedo, dia do aniversário da minha pequena grande mulher, até quando vou poder admirar o sol que nasce tímido na linha do horizonte, a sorrir pra mim?

E muitos até quando ficam por aqui.

Ontem fiz uma visita rápida a um amigo que luta para vencer uma insidiosa e cruel enfermidade.  E como sinto saudade dos seus whatsaps que tanto me alegravam em momentos vários de dantes. Em muitos ele dizia: “Paulo, como você escreve bem”! Em outros ele assim escrevia: “amigo Paulo. Eu te amo”.

De repente suas mensagens escassearam. Seus e-mails desapareceram do meu computador.

Continuei a fazer a ele visitinhas fugazes. Não mais era possível levá-lo a passear na minha caminhoneta prateada. Sempre suja. Por ser carro usado na roça. Onde, num dia perto, ele foi comigo.

E quantas e quantas crônicas a ele dirigi. Algumas foram lidas a ele. E ele me ouviu atentamente. Fui prefaciador de um livro seu. Um belo exemplo de como fazer crônicas a perfeição.

Já ontem, ao chegar da minha rocinha prejuizenta, onde uma nova casa nunca fica pronta, devido a muitos percalços, de novo parei o carro defronte a sua morada.

Encontrei-o de olhos fechados. Sem ao menos me dirigir os olhos inteligentes recheados de ótimo humor ácido.

Meu amigo moribundo parecia estar dormindo. Não do meu mesmo jeito do meu querido Theo.

Seu cuidador, um zeloso moço, o qual já conhecia, fazia um esforço hercúleo para bem cuidar do meu amigo.

Fiz uma foto de nós dois. Ela foi postada no Face. Não foi possível nele assistir um único sorriso. Um derradeiro abraço não partiu dele. Apenas de mim foi a ele encaminhado. Um ósculo carinhoso depositei em sua testa de pele fina e clara. E ele nem tchum pra mim.

Foi duro constatar, como médico, que a vida daquela pessoa geradora de uma prole linda estava se despedindo da vida. Para abraçar a morte de olhos fechados.

Quando alguém, de longe, ao ver a fotografia de nós dois naquela página onde escrevo tanto, logo esta crônica ali vai ser lida, comentou que sempre estou ao lado dele, do meu amigo Pedro Coimbra, a ele respondi com um choroso “até quando”.

Até quando? Meu amigo Pedro? Não sei…

Deixe uma resposta